domingo, 28 de setembro de 2025

Mania

Acho que a parte mais difícil da bipolaridade é sentir falta da mania. Há alguns dias venho tendo esse sentimento agridoce, um sentimento quase proibido, afinal, como e para quem eu poderia confessar isso, sem receber de volta algum tipo de julgamento?

Como eu poderia sentir falta de algo que prejudicou minha saúde, minhas relações, meu trabalho, meu raciocínio? Como posso sentir falta de um momento onde, claramente, eu não era mais eu? Talvez porque ali, dentro da loucura da minha cabeça, eu me sentisse mais eu do que nunca, mesmo que para os outros, eu não fosse.


O que significa ser eu, na verdade? Porque, quando não estou em mania – o que, até o momento, aconteceu de cinco em cinco anos, por três vezes – eu estou por muito tempo depressiva, ou preguiçosa, ou sedentária; eu sou essa pessoa? Porque eu me lembro de já ter sido eu e eu não era assim.


Eu tinha vontade de viver, de trabalhar, de cuidar de mim e da minha casa; tinha vontade de me movimentar, de ler e ouvia músicas todos os dias; eu reclamava sim, mas conseguia sonhar e me organizar pra tirar esses sonhos no papel... Tudo isso antes do primeiro surto.


Foi como se, por ter sido tanto eu, eu tivesse desbloqueado uma versão turbinada de mim mesma. E foi horrível. E maravilhoso. O medo de voltar para isso sempre foi tão real quanto a certeza de que vivi os melhores dias.


De fato, o que tem de bom em depender dos outros? Em ser altamente medicada? Em não conseguir dormir? Em ser tida como louca pelo mundo à sua volta? Mas o que tem de ruim em receber tanta atenção e cuidado? Em poder agir como criança? Em viver conforme a realidade da minha cabeça? Em ter tempo para criar, sonhar, produzir... Viver?


Parece que, após ter entendido que eu não podia ser tanto eu quanto sou, pois isso me traria riscos de ter outro episódio de mania, menos eu fui me permitindo ser. Hoje eu sei que não posso ficar sem remédios, não posso fugir da rotina de sono, não posso abraçar muitos planos e projetos ao mesmo tempo. Com isso, eu acabo fazendo o mínimo, sempre.


Quanto menos eu faço, por medo de ter outro episódio que, para além de traumático, é libertador, menos eu me sinto eu; quanto menos me sinto eu, mais sinto saudades da mania, pois, além de eu ser produtiva e me sentir eu, viva, disposta, eu fazia sentido, talvez não para os outros, mas para mim. É como se a mania tivesse se tornado meu referencial de normalidade porque nela eu já não tinha medo (da própria mania, que ironia).


Eu sei, racionalmente, que se eu acordar cedo, fazer atividade física, estudar, trabalhar, cuidar da casa, ter um momento de lazer e repetir isso todos os dias e todas as semanas, eu não vou, necessariamente, voltar para aquele lugar. Mas eu sinto que vou, porque é como se, quanto mais eu for eu, enérgica, feliz e produtiva, mais chances eu vou ter de querer abraçar o mundo com as pernas e... Me tornar mais eu do que nunca.

domingo, 14 de setembro de 2025

O amor é o segredo de tudo

Eu amo.
Tenho duas frases preferidas que ilustram:
“A vida é desse caos todo e se não fosse pra amar, eu nem viria.”;
“O amor é o segredo de tudo.”.
E eu amo.

 Há algum tempo, soterrada na minha própria lamentação e desânimo, venho me esquecendo do quanto eu amo – apesar de ter a segunda frase tatuada na pele, visível, não a lia há algum tempo; cheguei a pensar recentemente: “Acho que não sinto mais esse amor que já senti.”, mas, entre uma música e outra, entre momentos de vislumbre do horizonte, eu reencontrei esse amor dentro de mim.

 Acontece que muita gente que eu amei acabou indo embora, talvez porque eu não soube amar direito – entenda direito como: da forma que essa pessoa gostaria ou precisava – ou porque essas pessoas não souberam lidar e me amar como eu precisava ou, simplesmente, porque a vida abre bifurcações e nós seguimos sempre o nosso próprio caminho, nem sempre junto com todos aqueles que gostaríamos.

 O fato é que, por ter passado por tantos lutos em poucos anos, luto daqueles que estão vivos, mas decidiram ir embora, eu fiz a maior burrice que julgo que alguém possa fazer: me recolhi, me apequenei, entendi que não valeria a pena amar, porque o amor me traria frustração, decepção, fins. Mas, não amar seria não ser quem eu sou e não ser quem a gente é, é o atalho para a tristeza.

 Então, voltei a amar. Mas, perceba: ao dizer que o amor é o segredo de tudo, entendemos que o amor está em tudo e no centro de tudo. Não é sobre amar somente o que é correspondido, somente o que é prazeroso e bonito, é sobre amar a tudo e completamente. Amar até o inexiste.

 Eu não conseguiria te explicar, nem que eu quisesse, mas eu te desejo que todo o amor do mundo invada todo o seu ser até que você entenda que você é todo amor e que amar é para você – assim como é para mim – a tradução do seu ser. Que você respire amor, que você seja amor; que o amor seja o segredo de tudo para você também.

quarta-feira, 13 de agosto de 2025

A despeito de nós

"As coisas são e tudo floresce a despeito de nós."
Sete Vidas – Pitty

Estive com essa frase na cabeça há alguns dias, talvez não com a mesma interpretação que a Pitty quis trazer, mas como uma materialização em palavras de um emaranhado de pensamentos e sentimentos que ando tendo a respeito de fins, sejam de ciclos ou de relacionamentos.

Eu sou do time “deu certo enquanto tinha que dar” e não do time “perdi meu tempo”, pois acredito que o segundo grupo tende a sofrer mais com os finais, afinal, tudo de bom que existiu, automaticamente cai por terra e deixa de ter existido – o que para mim não faz sentido.

Exemplo: em minha cidade existiram construções que hoje não existem mais, mas elas estão guardadas em fotografias antigas que meus pais guardam ou em grupos do Facebook que guardam a memória da cidade; isso quer dizer que, por que não existem mais, nunca existiram? Não. Logo, quando as coisas acabam, elas não deixam de existir.

Assim como a morte. Ela por si só não apaga a existência daquele que partiu, por outro lado, quem ficou vai passar pelo luto. O luto existe para todas as mortes que enfrentamos, sejam elas literais ou não.

Andei pensando em tudo isso porque enfrento mais um fim, inevitavelmente; a vida é cheia desses momentos. Tento me acalentar pensando que isso já existiu e, então, ainda existe, mesmo que só em fotografias e dentro do meu coração, talvez não no coração de quem partiu, figurativamente, nesse caso.

E por que todo esse sentimento incômodo de perder alguém que se ama e esses pensamentos a respeito de que a relação continua existindo, em algum lugar desse Universo (mesmo que seja o meu Universo interno), me fizeram lembrar desse verso dessa música?

Porque, claro, as coisas são como eram e como sempre serão, pelo simples fato de um dia já terem sido; e são a despeito de nós, a despeito da vontade de acreditar que elas nunca foram, simplesmente porque deixaram de ser, no presente; a despeito do sentimento de perda de tempo ou de que tudo foi uma mentira. Um dia elas foram. E foram de verdade.

sexta-feira, 11 de julho de 2025

Notas

Releio o que escrevo com inveja e com pesar. Inveja de escrever tão bem quanto eu julgo ter escrito e pesar por saber que se não escrevo mais, não tenho nada além de mim mesma a culpar.

Eu comecei escrevendo para colocar tudo para fora, não me importava quem leria – ou se alguém leria. Depois, passei a publicar em um blog, com o simples intuito de ter meus textos organizados, de fácil acesso. Então surgiu a oportunidade de publicá-los em um livro, tão bem recebido e elogiado.

Depois disso, parecia o fim. Era como se eu já tivesse cumprido o propósito inicial. Mas, não seria ele o de apenas colocar tudo para fora? O livro me trouxe uma sensação de dever cumprido, mas ao mesmo tempo era como se me dissesse: "Ok, todo mundo já leu o que você quis dizer, e agora?". E eu não tinha resposta pra essa pergunta.

Agora mesmo, quando me surgiu a ideia desse texto, busquei por alguns segundos o aplicativo "Notas" em meu celular, que por anos foi meu melhor amigo. E, finalizando esse texto, me pego pensando que ele vai ficar esquecido nesse aplicativo ou, no máximo, organizado na pasta de crônicas em meu notebook. Não que alguém de fato acessasse aquele blog, mas que fim fúnebre para qualquer escrito, ser mantido preso pelo próprio autor, sem a menor possibilidade de ser lido.

Talvez só o que me falte é trazer novamente a possibilidade de alguém ler, nem que seja eu mesma, mas por fora dos meus próprios acessos pessoais, on-line.

quarta-feira, 10 de maio de 2023

Silêncio

Hoje eu decidi me calar, ou melhor, a minha voz me calou por mim – engraçado que, em dois dias, farei 29 anos e eu estou em um momento de introspecção, sem vontade de comemorar esse ano; foi quase como se meu corpo tivesse entendido o recado e falado: “Pode deixar, vou te deixar uns diazinhos sem voz e de cama.”. Sou grata por isso, então.

Geralmente em épocas de aniversários eu fico nostálgica, acho que todos ficamos, não? Mas esse ano parece que a coisa tá pegando firme aqui dentro. Porque foi um processo tão visível (para mim mesma, pelo menos) de transformação, dentro desses poucos anos que se deram dos 20 para cá, que hoje eu não reconheço aquela menina que eu fui.

Só que eu também sinto saudades dela – não por inteira, mas de alguns aspectos dela. Da doçura, misturada com loucura e inconsequência. Ela sentia tudo à flor da pele, eu não. Ela chorava, sentia raivas desmedidas e tristezas insuportáveis, eu não. Entretanto, ela não era tão feliz; hoje eu tenho crises de ansiedade de tanta alegria – chega a ser triste que minha alegria me desencadeie essa resposta, mas é a mais pura verdade, no fim das contas eu dou risada e abraço essa alegria.

Eu sinto falta das palavras dela na minha cabeça, da facilidade que ela tinha em fazer um texto incrível do absoluto nada, ela acordava no meio da noite com ideias de textos e os fazia em um piscar de olhos! Agora, além de eu demorar meses para conseguir ter a ideia de algum texto, quando os releio ao final da produção, sinto que estão todos meia boca – fazer o quê? Vai ver perdi o jeito da coisa, quando aquela loucura foi embora deve ter levado as inspirações junto.

Mas não me sinto mais tão triste em não escrever tanto. Em algum momento, há muitos anos, aquela menina me falou o seguinte: “Você não precisa escrever tudo, pois tudo já está escrito.”. E eu fiquei em paz com isso. Não é meu papel fazer descobertas revolucionárias ou escrever os textos mais incríveis a serem lidos, eu posso me aposentar ou então continuar de forma medíocre, fica a meu critério.

Como as escritas sempre foram mais para mim do que para você – que me acompanhou aqui por tantos anos e hoje já nem lembra que eu escrevia – eu sigo escrevendo, de tempos em tempos, com a qualidade cada vez mais duvidosa, agradecendo aquela menina de 20 anos por ter me trazido até aqui de uma forma tão intensa e pura – para ela, todo o meu amor.