"Bloqueio
criativo é um fenômeno envolvendo a perda temporária da habilidade de continuar
a gerar conteúdo, geralmente por falta de inspiração ou criatividade."
Escrevo
há pouco mais de uma década e sofro desse mal antes mesmo de tomar consciência
de que escrevia; hoje me deu saudades de falar sobre alguma coisa e, por que
não sobre isso?
Lembro-me
do meu primeiro bloqueio, eu ainda não tinha meu blog e salvava todas as minhas
crônicas no meu computador, aqueles brancos de tubo, que a gente conectava na
Internet discada e protegia o computador com capas plásticas, lembra? Um belo
dia ele decidiu descansar em paz e eu perdi todos os meus textos. Passei seis
meses em luto por isso, remoendo e repensando cada palavra e vírgula que eu
havia perdido. Quando voltei a sentir a necessidade de escrever, criei o blog
para que as chances de perder meus textos novamente fossem drasticamente
reduzidas – não vamos dizer extintas, porque nunca se sabe quando uma
plataforma resolve sair do ar.
Meu
segundo grande bloqueio foi quando cheguei à conclusão (depois de muito ler e
pensar em paranoias desnecessárias) de que tudo já havia sido escrito.
Absolutamente tudo. Então, passei alguns meses pensando que eu tinha um
dom/hobby/amor por algo “desnecessário”; todas as histórias que foram e
continuam sendo contadas são e sempre serão as mesmas, por mais que eu me
empenhasse em algum trabalho e modificasse sutil ou drasticamente o enredo, eu
sentia que não estava fazendo nada de novo, e isso me desmotivava. Mas percebi
que, apesar disso, a agitação interna de querer explicar, mais uma vez e sob
outros pontos de vistas, era maior do que o desconforto em saber que alguém já
havia estado ali antes.
Então,
pela terceira vez, fui bloqueada após três semestres cursando Psicologia, onde
minha visão de mundo havia começado a se modificar e, inquestionavelmente, meu
vocabulário também. Ao mesmo tempo em que eu gostava de ter um novo repertório
e uma nova linha de raciocínio nos meus textos, eu já não me reconhecia neles
ao finalizá-los; esse bloqueio perdurou um ano. Escrevi com uma frequência
pequena, mas boa o suficiente para que eu aceitasse e aprendesse que aquele era
o meu estilo de escrever, por assim dizer, a partir de então. E mais, aceitei
que isso vai mudar constantemente com o passar dos anos e nada posso fazer a
respeito.
Pela
quarta e última vez (por enquanto, pois é o bloqueio onde ainda me encontro)
foi quando eu percebi que já não havia motivos para escrever suficientes que
suprissem a minha vontade de fazê-lo. Eventualmente, como agora, sinto a
necessidade de escrever à quem me lê como alguém que escreve à um amigo, sem um
enredo elaborado, sem dizer sobre um coração partido ou transbordando de amor,
apenas compartilhar uma informação; seja ela uma banalidade do meu dia ou uma
angústia que me inquieta. Mas eu, que passei minha primeira década com o olhar
distante de quem me lê, sem realmente trocar uma ideia, sem falar
informalmente, sempre te fazendo sentir meus textos como se fosse uma sensação
sua, e não minha, me vi completamente perdida.
Agora,
por exemplo, fico me questionando se você está pensando algo como: "Que
legal! Conhecer a parte mais humana e menos a poética.", ou se realmente
já não está pensando nada, pois não consegui prender sua atenção até aqui (se
for esse o caso, me desculpe, mas preciso fazê-lo primeiro por mim). Em todo
caso, se esse bloqueio vai passar, como os anteriores, ou se me adaptarei a
ele, como o último, só o tempo para nos dizer. Talvez eu aceite um meio termo e
siga sendo não só alguém que descreva uma emoção sua, mas também alguém que
compartilha as próprias emoções.
Por
hora, posso dizer que com todos os meus bloqueios – porque sim, existiram
outros que duraram um pouco menos e não tiveram um impacto para que eu me
lembrasse com o passar dos anos – aprendi algumas coisas: 1) Eu nunca vou
deixar de me encantar com a escrita, com o poder de tocar e ser tocada pelo
outro, pela beleza que eu enxergo em cada vírgula, poema, página em branco,
reticências... 2) E enquanto eu puder vou continuar fazendo, ainda que só para
mim, pois é a minha maneira de lidar com o mundo. 3) E, caso eu esbarre em
alguém que seja tão apaixonado – leia: louco – por um encantamento tão
banalizado e esquecido que é a literatura (seja ela extraordinária ou
humildemente a minha), por um segundo ou dois a sensação será a de que minha
alma trocou de casa por alguns segundos, de que eu encontrei o motivo pelo qual
eu comecei a escrever, ainda criança; de que eu reencontrei a Gabriella que
passava horas, dias, enfiada em páginas e páginas e chorou todas as vezes que
foi ao Museu da Língua Portuguesa... Isso, ouso te chamar de meu amigo, não tem
preço.
Mas,
em todo caso, se algum dia eu desistir de escrever, voltarei ao meu segundo
bloqueio em paz, afinal, tudo já foi escrito.