domingo, 28 de maio de 2017

Emma


Quando pequena, nunca tive oportunidade de ter um animal de estimação, além dos peixes Beta que minha mãe me dava. Admirava a dedicação, amor e carinho com que meus amigos e familiares cuidavam de seus cachorros e gatos, sonhando com o dia que eu tivesse o meu, imaginando qual nome daria e como ele seria, fantasiando como seria minha ligação e paciência com ele. 

Nada do que eu imaginei chegou perto do que realmente foi. Eu não escolhi, mas fui escolhida. Minha casa vivia com um gato ou outro a me visitar; até que a Emma chegou e ficou. Nos primeiros dias ela foi chamada de Robin, pois não sabíamos se, de fato, ela era fêmea. Com o tempo, ela foi ganhando espaço em casa, inclusive em cima da cabeça da minha mãe, até finalmente roubar nossos corações. 

Quando ela já estava dominando todo o território que quisesse, Emma começou a ter um sangramento e precisei deixá-la dormir do lado de fora, estávamos tão acostumadas a dividir a cama que não sei qual coração se partiu mais, o meu por não poder mexer nela durante a noite ou o dela por não poder deitar em cima das minhas costas. 

Levei-a ao veterinário, marquei ultrassom; passeamos de ônibus e de Uber, a vi assustada em um ambiente com pessoas que nunca vimos, mas me mantive firme, para acalmar a ela e a mim. Quando ela foi operada, fiquei do lado de fora como uma mãe ansiosa e aflita, a cirurgia acabou rápido, mas a anestesia duraria ainda algumas horas. 

Lembro do veterinário me explicando tudo e o quão difícil seria para minha mãe e eu darmos remédio a ela; passei no petshop para comprar a roupa cirúrgica e os remédios e fomos para casa. Cheguei e a vesti antes que acordasse, mas ela estava tão imóvel que eu, mãe de primeira viagem, chorei copiosamente em desespero, com medo de que ela não acordasse mais.

As primeiras horas após a cirurgia, onde eu dediquei meu dia totalmente a ela, pois ela mal parava em pé, os primeiros dias em que minha mãe e eu facilmente dávamos remédio, toda minha paciência, preocupação e dedicação com um ser que não podia me falar nada, mas deitava no meu colo com aquele ronronar em agradecimento que aquecia meu coração. 

Os dias finais do remédio, onde ela estava forte o suficiente para dificultar o nosso trabalho, quando ela voltou a comer normalmente, miar quando via minha mãe perto do pote de ração, ou suas travessuras em cima do guarda roupa e das taças da cozinha.

Quando chorei e ela ficou ao meu lado, me olhando e colocou minha mão entre suas patas, o que me fez chorar mais ainda. Quando eu deitava na rede para ler, ela dava um jeito de subir e ficar ali, até que ficasse desconfortável e ela descesse e deitasse no chão, ao meu lado. Ou quando eu fazia abdominais e ela se deitava em cima de mim, claro.

Tantos pequenos e infinitos detalhes que vistos de fora não têm importância, mas que você, dona/mãe, mata e morre pelo seu filho de estimação. Você se acostuma, se dói, se preocupa e se desespera por essa pequena vida que lhe foi confiada; nada é tão gratificante quanto tê-lo ali, contigo. 

Só que todo esse ciclo tem um fim e eu também não imaginava como seria a despedida, já vi amigos perdendo seus animais de estimação e achei que eu não sofreria tanto, doce engano... Nenhum tipo de perda é aceitável ou dói menos, não ter seu melhor amigo ali contigo todo dia é desesperador, no início. 

A Emma costumava sair enquanto eu não estava e voltava próximo ao meu horário de chegar, com isso, me acostumei a checar a garagem e o quintal, sempre que chego em casa. Procurei-a quando cheguei, nada. Um dia, dois. Uma semana. Disseram-me que era normal, gatos somem mesmo, mas eu sabia que ela não era disso e me desesperei em constatar que ela não voltaria mais; mesmo assim não deixei de checar minha casa, por costume. Hoje não olho mais, mas quando escuto gatos no telhado prendo a respiração para ver se reconheço o miado dela, é em vão, eu sei, mas é também involuntário. 

Ela se foi, e o pior é não saber para onde, se está bem ou viva, sendo cuidada ou não. De qualquer forma, o amor que senti e aprendi com ela está aqui e ficará guardado para sempre no meu coração. Esse texto foi para guarda-la, o mais detalhadamente possível, na minha memória.